Sendo eu um temível sportinguista (a roçar o fanatismo, confesso), sócio do clube activo (ainda esta semana contribuí para a Missão Pavilhão) e um indefectível defensor de Bruno de Carvalho, não sou toldado intelectualmente ao ponto de embarcar em toda a quimera populista que tem marcado este ano e meio de mandato do “presidente sem medo” (alusão clara ao facto de Bruno ser neto do Almirante sem medo, Pinheiro de Azevedo, figura política do período do PREC).
Neste último ano e meio, é assertivo dizer que Bruno de Carvalho deu um novo rosto ao Sporting Clube de Portugal. Ao romper com as linhas programáticas profundamente erráticas e erradas dos seus antecessores (em sportinguismo diz-se da “dinastia croquete”) Bruno de Carvalho assentou de novo o Sporting Clube de Portugal no caminho que todos os sportinguistas há muito anseavam: um clube moderno, com uma excelente gestão e com uma excelente margem de evolução da sua inexistente marca.
Em ano e meio de trabalho, Bruno de Carvalho conseguiu devolver o Sporting à luta pelo título no futebol e em várias modalidades, fazendo com que estas pudessem optimizar todos os seus recursos e fazer mais com menos:
– Assente numa gestão equilibrada de recursos, renegociou a dívida do clube (ao nível da estrutura da dívida, ao contrário do perdão de dívida que muitos tem bradado por aí aos 7 ventos), já amortizou algum do passivo consolidado do grupo (SAD + Clube + Sporting SGPS), conseguiu resgatar percentagens de direitos económicos de alguns jogadores (na posse da Holdimo) através de uma acção de engenharia financeira onde trocou as mesmas por acções na SAD verde e branca, após um aumento de capital social no clube, reduziu em cerca de 40% os orçamentos do futebol e das várias modalidades (com resultados satisfatórios tendo em conta os obtidos pelos seus antecessores), acabou com as mordomias de luxo a que tinham direito alguns dos administradores da SAD, reformulou as despesas de manutenção do estádio, da Academia de Alcochete, das Piscinas do Clube e da Pista de Atletismo Moniz Pereira, conseguindo diminuir os custos de manutenção destas em 30% e ainda conseguiu, logo no primeiro mandato, apresentar um lucro positivo de 7 milhões de euros na SAD na primeira época desportiva. Só no futebol, entre dispensas de jogadores com ordenados elevados, receitas de estágio, vendas de jogadores, direitos televisivos, direitos de imagem, marketing e merchandizing, Bruno de Carvalho conseguiu acrescentar aos cofres do Sporting cerca de 70 milhões de euros, valor que de resto está a ser aplicado na redução do passivo consolidado, no novo pavilhão que o Clube pretende construir para as suas modalidades de pavilhão e na recompra de percentagens de passes de atletas que não estavam na posse do Sporting Clube de Portugal mas na posse de fundos.
– Ao nível da marca Sporting, Bruno de Carvalho tem optado por medidas que visam incrementar o valor desta para os cofres do clube, através de sucessivas campanhas que tem tido um nível interessante de adesão e sucesso (novas modalidades de associado do clube; campanha gamebox – 28 mil vendas registadas até 31 de Agosto; campanha da camisola do 12º jogador; Missão Pavilhão – 9 milhões de euros angariados até ao momento junto dos associados; Bilhetes AntiCrise para os jogos em casa; projecção do clube e da sua maravilhosa formação em países como a India, Moçambique, Canadá, Angola, Cabo Verde, África do Sul, China, Estados Unidos da América, Reino Unido, Rússia; abertura de novas escolas de formação do Sporting em várias capitais de distrito do território nacional, ilhas, África do Sul, Canadá, India, Moçambique, Guiné-Bissau).
Outra prova do empenho que o presidente tem mostrado em valorizar a Marca Sporting foi a criação da Sporting TV, canal de televisão que tem aproximado ainda mais o publico sportinguista do clube.
– Desportivamente, perante um cenário de crise (relembro que na renegociação com os credores em Junho do ano passado só existiam duas alternativas; a renegociação da estrutura da dívida ou a necessidade de requerer um PER; solução que não interessava aos bancos) Bruno de Carvalho foi dotando o clube de equipas competitivas, que, actualmente, a bom da verdade, fazem sonhar os sportinguistas com a hipótese de conquista de títulos.
Apostando também na formação, o Sporting é inegavelmente hoje, novamente, um grande clube formador europeu e um clube que procura constantemente apostar na prata da casa em detrimento das soluções que o mercado de transferências vai oferecendo a Alvalade.
Contudo, o presidente leonino tem apostado, noutro prisma, por algumas cruzadas pessoais (arrastando a imagem da instituição consigo) as quais algumas aprovo (o Sporting precisava há muito de um líder forte, capaz de se impor) e outras não aprovo.
Cruzada #1 – A cruzada contra o FC Porto – Diz-se que tudo começou em Junho de 2013 na final da Taça de Portugal de Andebol, disputada no Algarve entre FC Porto e Sporting. Nas bancadas do pavilhão, o administradores da SAD do FC Porto e vice-presidente do clube Adelino Caldeira, um dos braços direitos de Jorge Nuno Pinto da Costa, perito em provocar dirigentes dos rivais neste tipo de infraestruturas desportivas, deverá ter deixado Bruno de Carvalho de mão estendida quanto este se encaminhava para o cumprimentar, mandando alguns impropérios para o ar contra o presidente leonino. Nesse mesmo dia, o Sporting Clube de Portugal rompeu relações com o clube portuense e, alegadamente, este voltou a vingar-se do Sporting nas transferências de João Moutinho e James Rodriguez para o Mónaco, modificando os valores pelos quais o médio internacional português foi vendido em conjunto com o Colombiano, para penalizar o Sporting num negócio onde a equipa leonina tinha a possibilidade de encaixar 25% das mais-valias resultantes de um negócio acima dos 11 milhões de euros, valor pago pelo FC Porto ao clube leonino na aquisição do actual jogador do Mónaco. Desde então, é costume o presidente do Sporting negar-se a sentar à mesma mesa onde esteja um responsável directivo dos dragões.
Cruzada #2 – A cruzada contra Bruma e o seu empresário. Bruma reinvindicava ser um jogador livre quando tinha 1 ano de contrato por cumprir com o Sporting, cuja opção pertencia ao Sporting. O seu empresário e o seu representante legal (Catió Baldé e Bebiano Gomes) alegavam que a anterior direcção do Sporting tinha assinado um contrato-promessa inválido com o jogador, não devendo este cumprir esse mesmo ano de contrato. Estes dois agentes começaram a contenda juntos, separando-se rapidamente com o decurso da mesma: Bebiano Gomes revelou ser o representante legal do jogador\empresário visto que Baldé não tem em sua posse nenhum documento legal que o identifique como empresário de acordo com as regras da FIFA. O Sporting recorreu a uma Comissão Arbitral Paritária da Liga, comissão destacada por aquele organismo para resolver situações relacionadas com o contrato de trabalho de jogadores profissionais. Bruno de Carvalho sempre reiterou durante este processo que o Sporting tinha razão na questiúncula jurídica e, caso não lhe fosse dada razão, iria até às últimas consequências para lhe ser dada razão, ou seja, os tribunais civis. A CAP deu razão ao Sporting e o Sporting tratou de arranjar o melhor negócio para ambas as partes: sendo Bruma um activo interessante da SAD em último ano de contrato e um jogador desejado por vários clubes europeus com posses financeiras, foi vendido ao Galatasaray por 12 milhões de euros. Ambas as partes ficaram a ganhar no negócio.
Cruzada #3 – Na sequência do caso Bruma, Bruno de Carvalho começou uma cruzada contra os empresários. Avançando com a ideia que o Sporting não seria novamente um nicho ávido para estes lucrarem com chantagens, incentivou vários jogadores a desmarcarem-se dos seus empresários assim como deixou de prometer comissões aos empresários que iam trazendo reforços e possíveis reforços para o clube de Alvalade.
Cruzada #4 – A arbitragem. Bruno de Carvalho foi um dos primeiros presidentes do futebol português, senão o primeiro a admitir que o Sporting tinha sido beneficiado e prejudicado durante a última temporada desportiva. O presidente do Sporting iniciou uma autêntica cruzada contra o Conselho de Arbitragem da FPF após os prejuízos desportivos arcados nas eliminações precoces da Taça da Liga, Taça de Portugal, e nos empates obtidos frente a Nacional, Vitória de Setúbal, Académica, Estoril, resultados que ajudaram o Sporting a distanciar-se da possibilidade de conquistar o título nacional. Criou-se um movimento de adeptos leoninos contra as arbitragens chamado “Movimento Basta”, movimento que teve a sua génese num apelo do presidente. A cruzada que o presidente iniciou neste campo poderá ser prejudicial ao clube durante esta temporada.
Cruzada #5 – A cruzada por um futebol mais transparente. A célebre reunião de clubes profissionais realizada em Alvalade na temporada passada foi o mote de partida que o presidente do Sporting escolheu para apresentar às instituições que tutelam o futebol em Portugal (FPF, Liga de Clubes) e aos órgãos de soberania (Governo através da Secretaria de Estado do Desporto; Assembleia da República) um documento onde foram apresentadas algumas medidas para estes avançarem com a reformulação do paradigma do futebol português. O documento contem entre outras medidas de menor importância, alterações às actuais normas que regulam a relação entre clubes e arbitragem, clubes e federação, direitos televisivos, apostas online, tabela de preços praticados no sector, impostos cobrados pelo Estado nas vendas realizadas no sector (principalmente no preço dos bilhetes; uma das medidas visava reduzir o IVA cobrado nos bilhetes de 23% para 6%).
A última cruzada de Bruno de Carvalho deu-se com os fundos de investimento de jogadores.
Os fundos de investimento mobiliários tem neste momento uma existência ambígua na europa do futebol. Se em campeonatos como o Inglês, Alemão e Holandês não são permitidos por lei, pelos estatutos das federações ou das competições, noutros campeonatos como o português, espanhol, italiano ou Russo, são fontes predominantemente utilizadas pelos clubes para aquisição de jogadores que de outra forma não teriam acesso ou refinanciamento da actividade. Isto é, ou os fundos adquirem juntamente com os clubes certos jogadores, recebendo uma determinada percentagem acordada contratualmente entre ambos em caso de venda, ou o clube assume a compra do jogador e negoceia a venda de parte dos direitos económicos do jogador a um fundo, podendo no futuro recomprar a parte alienada ao fundo por um valor contratual negociado ou renegociável com o mesmo, quase sempre no final de cada temporada desportiva.
O caso Rojo marcou o auge da ruptura de Bruno de Carvalho com os ditos fundos. Isto porque, existindo uma proposta de 20 milhões de euros do Manchester United pelo jogador, detendo o Sporting apenas 25% da transferência (os restantes 75% eram detidos pela Doyen Sports, fundo de investimento que cobriu 3 dos 4 milhões investidos pelo jogador aquando da sua contratação ao Spartak de Moscovo; o Sporting apenas deu um milhão na referida contratação), tendo ainda o Sporting que indeminizar o Spartak de Moscovo em cerca de 50% do valor que arrecadasse com o negócio, o Sporting só iria lucrar 2 milhões com a venda do jogador para o clube de Manchester.
Aproveitando um comunicado lançado pela Doyen Sports a respeito da renúncia mantida pelo clube de Alvalade em vender o atleta pelo valor da proposta, Bruno de Carvalho rompeu a ligação do clube à Doyen por via do contrato celebrado aquando da contratação do internacional argentino ao clube russo, alegando que a Doyen teria violado uma das cláusulas desse mesmo contrato, em concreto, o impedimento que a Doyen tinha em negociar o jogador com um clube terceiro bem como revelar informações sobre o contrato do jogador ou o valor pelo qual o Sporting estaria disposto a negociar. Segundo o contrato assinado pela administração Godinho Lopes e a Doyen, só o Sporting estaria mandatado a negociar uma transferência do jogador para terceiros. O Sporting recebeu a garantia de 20 milhões prestada pelo clube inglês e não se apressou a efectuar o respectivo pagamento de 15 milhões de euros cativos ao fundo. O caso seguiu para o Tribunal Arbitral do Desporto (TAS), vara jurídica onde, Bruno de Carvalho, voltou a reiterar a extrema possibilidade da causa ser ganha pelo Sporting, em virtude da aceitação por parte do TAS da jurisprudência que anda a ser criada pelos organismos tutelários do futebol mundial e europeu (FIFA, UEFA) na sua cruzada junto das federações para criar legislação que não permita a existência e acção de fundos de investimento.
Enquanto a decisão não sai, uma coisa é certa afirmar: a cruzada de Bruno de Carvalho contra os fundos poderá ser bastante nociva ao Sporting. Não detendo capitais próprios nem linhas de crédito junto da banca para poder realizar contratações acima de determinados valores (2\3 milhões de euros, no máximo), os fundos poderiam ser os maiores aliados do clube leonino no mercado, visto que poderiam ajudar o mesmo a atacar alvos apetecíveis a um custo muito reduzido, ora arcando os segundos com o valor das transferências, ora arriscando o clube na compra do jogador através de um mecanismo de engenharia financeira assente numa garantia: uma entidade bancária emite a garantia acima das possibilidades reais de crédito do clube desde que este apresente a garantia em como é capaz de reembolsar a entidade bancária com recurso à alienação dos direitos económicos do jogador contratado junto de terceiros. Não tendo linhas de crédito sólidas que permitam investir 4 ou 5 milhões numa mais-valia desportiva para a equipa de futebol, o desgaste que Bruno de Carvalho criou com todos os fundos de investimento através do rompimento da ligação contratual com a Doyen Sports, levará o Sporting a apenas poder licitar jogadores que estejam em final de contrato ou a baixo custo (1\2 milhões de euros no máximo). Os investidores, detentores destes fundos, agentes que não gostam de perder um cêntimo nos negócios que celebram, não terão confiança necessária para estabelecer uma parceria com um clube que, se aproveitou dos capitais de um fundo de investimento para adquirir um activo, cuja rentabilização clara, levou o clube de seguida, ou por necessidade de ganhar mais do que aquilo que poderia ganhar de facto, ou por razões contratuais, rasgou o contrato que tinha com esse fundo e lucrou, até ver, todo o bolo da transferência. Esse decréscimo que Bruno de Carvalho estimulou junto dessas entidades, poderá retirar no futuro, qualidade à equipa desportiva em sectores onde a formação não garanta suficiência do clube; contudo, já foi reiterado várias vezes pelo presidente do Sporting a necessidade extrema que o clube tem em competir, maioritariamente, com os produtos da sua formação.